O Museu da Língua Portuguesa hospeda sempre ilustres visitas
lusófonas.
É o português, enquanto língua mater, o pré-requisito
primeiro dessa ‘hospedaria’.
O hóspede da vez, no entanto, não se enquadra bem nesta categoria
adjetiva, nesta classificação que hora lhe dão, de ilustre visita.
Grande escritor do Brasil-Bahia, Jorge Amado nos trouxe uma
escrita tão espontânea que seus romances soam naturalistas, mergulhados em temáticas populares e muito filhos da
mistura que somos todos.
Sincretismo religioso, mestiçagem, erotismo, sensualidade,
malandragem somados a uma pitada de dendê e a muita semente de cacau nos trazem
a Bahia que ele inventou para si e para nosso deleite.
Um dos baratos da exposição é que ela não se ‘resume’ ao
universo das letras de Jorge Amado. Ela nos traz sua “densa e oleosa Bahia” nas
cores, nos sons, nos tons, nos cheiro e claro, na poesia. E nesta exposição, Jorge faz um passeio completo por nossos sentidos. Sinestésica.
Começamos a penetrar esta reconstrução de teu mundo, Jorge, pelo ouvido. Cabines com trechos de textos teus
ouvidos e lidos a um só tempo abrem a exposição. Começamos por aí uma imersão em teu universo, pedaços da cultura bahiana.
Daí, passamos a um pedaço de teu sincretismo.
Santos de toda religião, de toda cor, com toda sorte de adereços.
E a
mestiçagem, ilustrada não só na extensão do vocabulário dedicado ao tema; amulatado, negro retinto, negro-azul, escuro, branco de leite, alvo de neve, morena,
rosada, negro porreta, morena de tez pálida; mas em toda um sorte de adereços que bem
denotam esta mistura tão brasileira, esta infinda gama de mulatos e mestiços.
Da
cor do Brasil: todo credo, toda raça.
A sensualidade e o erotismo estão bem representados em uma
cabine exclusiva dedicada a esta temática tão presente em sua obra, tão sua. Nas paredes estão
letreiros iluminados nomeando as muitas ‘casas da luz vermelha’ ao longo de sua
obra. Ainda pelas paredes desta cabine visores que levam nossos olhos, só eles,
a trechos sensuais, eróticos, cheios daquela sexualidade latente e pungente, daquela libido natural.
Tudo isto somado a fotos mil, a um histórico das publicações
da imprensa internacional, trechos e mais trechos de textos e outros textos,
dendê, cacau, longa vitrine de livros, publicados aqui, ali e lá (no
estrangeiro próximo e distante, geográfica e culturamente).
E o dendê e o cacau também compõem cenografia tão rica. Paredes que nos surpreendem, brincando com nossos sentidos.
“Indagorinha” voltei de lá e me sinto ainda mergulhada naquele
universo, sobretudo no ritmo daquele quase dialeto.
Hoje “sei de saber sem dúvida” que Jorge Amado nos mostra
bem as cores do viver bahiano em toda sua extensão e que somos todos filhos da
mistura que a Bahia representa.