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segunda-feira, 30 de outubro de 2017

quem é Poliana Guerra?



Depois de um café da manhã caprichado, passamos, eu e o Lourenço, o dia inteiro rodando exposições de arte, BH afora! Estivemos, na verdade, em uma feira de artes, uma praça e uma exposição. Mas, tudo grande e tudo tanto, que nos tomou o dia todo!

Entre uma exposição e outra, à pé, como me sói fazer vezenquando; mas entretanto, contudo, no entanto, com o Lourenço no colo, deixa eu pensar,  por aí, uns 10 quarteirões, ele adormeceu e teve, portanto, um ‘descansinho’ (e eu um ‘cansação’!).  Curto, porque o caminho foi feito em algo como meia hora. E chegando lá, com os barulhos e contornos da exposição, ele acordou. E ficou o resto do dia ligadão nas artes comigo, descobrindo, narrando, rindo e legendando para mim todo o redor, todas as cores, formas e luzes, todas as (muitas) novidades.

Terminado o circuito artístico, descemos para um brinde final, ali no Café com Letras CCBB, espaço onde somos visitantes contumazes! Suco laranja-abacaxi do ladilá, chopp do ladicá e bruschettas margherita divididas e compartilhadas, foram nosso manjar, à luz do luar, ali na prazerosa área externa do café, depois de um dia deveras intenso!



Saindo dali, ainda passei, passamos, por um supermercado e só chegamos em casa por volta das 9 da noite. Dei um banho nele, imaginando que ele apagaria na sequência, dada a intensidade das últimas (muitas) horas! Eu queria me dar algumas outras horas de escrita e como ele interagiu em tempo integral, com tudo e com todos, só dormiu por meia hora e o dia estava quente, muito quente, imaginei que logo, logo teríamos um tempo a sós, o lápis, eu e a música!

Dado o banho, o deitei na cama devidamente cercado, deixei mamando e fui, também eu, me tirar a rua e o cansaço do corpo, debaixo d'água, ducha fria! Feito isto, comecei a me arrumar, na copa, um canto da escrita, lápis e papel, junto ao que comer, beber e música para ouvir!

Tão logo eu começo minhas 'arrumâncias', escuto uma vozinha do quarto: "mamãe, cabô tetê... mamãe, qué descê”. E mamãe levantou e foi ‘vê’ o que ‘fazê’! 

Chegando ao quarto, ele já estava descendo da cama... e cantando! “ a roda do ônibus roda, roda, roda, roda, peeeela cidade” (ainda empolgado porque "passeou" de ônibus, peeeela cidade, hoje!). Tradução: ele não dormiria tão cedo! O levei para a sala comigo, para meu canto da escrita, pensando em entretê-lo com os livrinhos recém ganhos da madrinha e que ele adorou, para que me deixasse escrever.  Tirei o jazz que me conduziria a escrita, junto à cervejinha artesanal recém destampada e à comida japonesa trazida da rua, para colocar algo mais suave. Coloquei ZAZ, cantora francesa, música 'francamente' pra cima, mas menos improviso e experimentalismo, para tentar conduzir humores e ânimos (e quem sabe algum sono) "sous le ciel de Paris"!.

De pé na cadeira, encostado à mesa, ele começou a dançar, balançando mesmo, e, apontando para a bandejinha à minha frente, pedir comida japonesa. "Mamãe, qué papá!". Diante da escolha dele -  Lourenço, vc quer peixe roxo ou peixe rosa?  - peixe roxo (atum, que ele adorou – é filho da mãe!), comecei a partir alguns sushis e sashimis para pegar pedacinhos menores com o hashi e lhe dar. Ao que de repente escuto: “Polianda Guerra!”  E falei: o quê, Lourenço? O que você falou? E por mais que eu insistisse, ele me olhava com um sorriso nos lábios e os olhinhos brilhando, uma carinha mais que safada e não falava nada.

Insisti até desistir e voltar para meus escritos. Ao que, dali a pouco, escuto novamente, "Polianda Guerra"! Ao final de outra leva de muita insistência, ele explicou: "é a mamãe!" E eu, para me certificar: - como é meu nome, Lourenço? E ele, não sem alguma insistência: "Polianda Guerra", substituindo o ponto final por um lindo sorriso sapeca!

Ah! Meu amor, dá um beijinho na mamãe! Ganhei  uns beijos molhados, um abraço apertado de olhinhos fechados com um sorriso gostoso e safado no rosto. Me inchei e enchi de alegria e com um outro sorriso leve e gostoso, nos olhos e na alma, fiz forte recarga do sentido da palavra mãe, com uma afinidade nascente de dias intensos partilhados e com um amor crescente, desde sempre, para sempre!

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

espiritismo: instinto e rendição



Que assim seja!*

Foi meu primeiro pensamento ao sair de uma sessão espírita, a minha primeira desde sempre, à busca de respostas a uma vontade de espiritualidade nascente em mim. E ela veio, deixei que ela viesse, em função de uma identidade percebida, devagar e desde há muito, com os princípios desta, digamos, filosofia de vida. 

Conheço pouco ou quase nada, mas sempre que ouvia ou lia algum de seus alicerces ou preceitos filosóficos, concordava ou inclinava o pensamento em um ângulo que permitisse convergências e interseções.  E sempre me prometia procurar um centro, ler mais, buscar, tentar ou conhecer alguma coisa antes de adotar como uma minha coluna cervical espiritual ou algo do gênero, mas nunca tinha alguma (nenhuma) pro atitude para buscas ou pesquisas ou leituras ou o que quer que me conduzisse por seus caminhos que, pela afinidade latente, me prometiam um encaixe ou conexão etérea. 

Mas adequado à filosofia espírita,  quando o momento chegou, ele se plantou e me tomou, de alguma forma, sem que eu planejasse ou me desse conta, inteiramente.  Na mesa do Café São José, após sessão no Cineclube da cidade, dividindo uma cervejinha com os cinéfilos de plantão, alguns deles falaram, a uma certa altura, de uma ida em grupo em um centro espírita de São Domingos do Prata, cidade vizinha e citaram o que o local trazia de novo e atraente, ao que eu me habilitei e candidatei  instantânea e prontamente. E fui. 

No dia seguinte, ainda a caminho, fiquei sabendo de minha tia, que se tratava de um casal de médiuns que abria as portas de casa (que era junto ao trabalho e à fazenda)  e recebiam muitos ali, uma vez por semana para uma sessão que vinha ficando conhecida e atrativa na região. 

Ao chegar, primeiro me surpreendeu a absoluta informalidade de tudo (tanto). Pessoas sentadas nas escadas, em cadeiras, no sofá, à mesa, pessoas na cozinha, em seu balcão, enfim, em todo canto havia uma alma (!)

Sentei no sofá e minha primeira impressão começou, muito prontamente, a me alimentar um nó na garganta. Não sei porque. Ouvir a música, ver o lugar, a informalidade, as pessoas, seu comportamento, sua entrega, sua leveza me fez chorar.  Não sabia (e não sei) porque, mas me permiti. Instinto e rendição nomeiam bem minha reação. Senti uma leveza tão grande que não consegui segurar e me permiti, me entreguei e chorei. 

Eram depoimentos, psicografias espontâneas, música, leitura do evangelho, comentários, choros, abraços, tudo junto e misturado em uma sessão absolutamente participativa. O fato de não haver um altar, púlpito ou um palco e das vozes serem descentralizadas dava um tom orgânico a tudo e reforçava minha sensação instintiva de encaixe.  Por instinto eu me sabia em casa, por instinto eu interpretava e fazia uma minha leitura significativa e positiva de todas as atitudes, participações e inserções porque, como foi dito a certa altura, cada mente vive na companhia que elege. 

As leituras, inserções, psicografias não tinham, em nenhum momento, um cunho doutrinário ou taxativo. Falavam em entender, sentir, respeitar, cantar, amar. Palavras de muita leveza e sabedoria precediam e concluíam cada leitura do evangelho, colocando-os como metáforas de guias de conduta moral e comportamental.  Elevar o pensamento, emitir luz, entrar em sintonia. 

Os pensamentos, ensinamentos, posturas, abertura, música, comportamentos transmitem uma paz indescritível.  Uma reflexão que me levou longe e longe me deixou, reflexão que me ganhou a adesão àquilo tudo, baseada em citação de Einstein: “Tudo é energia e isso é tudo que há”. 

A interpretação é de cada um. A entrega é minha.

* Espíritas, em geral não dizem amém, mas 'que assim seja'. Amém tem origem hebraica e significa que assim seja, mas preservar este termo em sua origem, carregaria algo de dogmático, avesso à autonomia da vontade, tão presente no ideário espírita.  Mas não é regra taxativa ou absoluta, como nada o é por aquelas 'bandas'. Cada um usa em suas preces, o que lhe parecer mais forte e verdadeiro!

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

exilados no afeto



Kamchatka é uma península ao leste da Rússia, mais próxima, geograficamente, dos EUA que de Moscou, que teve papel estratégico na Guerra Fria. Assim, Kamchatka está presente em algumas versões do jogo ‘War’ e representa um lugar de resistência, de esperança.

Em Kamchatka, o filme, Matias é um menino de 10 anos que vê sua vida mudar completamente quando seus pais começam a ser perseguidos pela ditadura argentina. Para escapar dos militares, a família é obrigada a largar todos os seus bens e fugir para uma fazenda no interior. E vemos o filme e toda a história pelos olhos (e voz) de Matias. Ele é nosso narrador, o que traz à estória, algumas situações espirituosas e sinceras.

Salta aos olhos, a dedicação dos pais em, naquela situação limite de exílio voluntário, proporcionar aos dois filhos pequenos, momentos legitimamente agradáveis. Em refeições, conversas, brincadeiras e ensinamentos, a tensão perde compasso e não parece que eles estão involuntariamente exilados em um sítio, pelos perigos ao redor, tão forte o afeto e .  E é aí que entra Kamchatka. A família joga War junto e, por desdobramentos do filme e das jogadas, fica a península contra o resto do mundo; o pai, jogando pela península contra todo o resto, usa-a como metáfora para o lugar de resistência!

Apesar de todas as nuances contextuais descritas acima, não se trata, no entanto, de um filme político. Trata-se de um retrato sensível e humano, em que a política serve de pano de fundo. Exilados no afeto, os personagens nos contam mais de relações que de conflitos!

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

folclore e espuma



Estive, dia desses,  de visita, arquitetada e planejada desde há muito, por terras paulistanas. Desde que deixei aquelas terras, como moradora, tenho que voltar, vez por outra, para recarregar as baterias, do afeto e das incansáveis e infinitas buscas, por tudo muito, desde sempre.

Seriam (e foram) poucos dias por ali, mas, ainda assim, reservei uma tarde inteira para a arteira (rimou!) que mora aqui dentro de mim e divide espaço com várias outras, porque poli são várias! 
Assim, pré planejada e agendada, já saí de Minas com duas visitas em meus roteiros. As duas exposições, em campos estéticos e conceituais tão absolutamente distantes, falam muito o nome de São Paulo!

Com sua arquitetura arrojada, a Japan House é observada por Niemeyer
Queria, primeiro e antes de tudo, conhecer a Japan House, que já havia visto em alguns posts de amigos e conhecidos rede social afora, como o primeiro centro cultural do mundo dedicado à arte nipônica, mencionando um vanguardismo, minimalismo, contemporaneidade e outras peculiaridades muito próprias daquela cultura. Me deixaram (os posts ) com muita vontade de conhecer os projetos artísticos em cartaz e o espaço.

Além disto, havia lido recentemente sobre uma exposição em homenagem à vida e obra da Inezita Barroso, no Itaú Cultural. Como li que a Japan House ficava ali na Paulista mesmo, pensei que matava, assim, dois coelhos de uma vezada só!

Comecei, em sentido contrário ao dos planos, por Inezita Barroso. Antes de comandar Viola, Minha Viola , Inezita já era considerada uma das mais importantes intérpretes e divulgadoras do cancioneiro caipira e de outras manifestações da música nacional de raiz. De tom mais folclórico que popular, era considerada uma das mais importantes intérpretes e divulgadoras do cancioneiro caipira e de outras manifestações da música nacional de raiz. Aprendi ali que, Além de gravar mais de 80 discos, atuou no cinema e esteve à frente de programas de rádio.

Entrada da Ocupação no Itaú Cultural
Com manuscritos e registros sonoros e audiovisuais, nos quais Inezita narra seus próprios passos; conteúdos, como entrevistas em vídeo com parentes e colegas, a rica exposição ainda traz uma série de materiais que a homenageada coletou ao longo de toda a vida – como fotos pessoais, bilhetes de fãs e recortes de jornais e revistas. Graduada em biblioteconomia, ela soube preservar e catalogar muito bem seu acervo, tornando a exposição riquíssima em informações e acervo.

Saindo dali já carregada de novidades, passei os olhos pelo mapa do metrô para desenhar meu próximo destino e entender como chegaria ali.

Bem, pernas para que te quero, uns 5 quarteirões adiante, já estava de frente ao belo prédio da Japan House. Sua fachada é já um cartão postal e foi executada por cinco artesãos especializados na arte do encaixe da madeira hinoki. Assim, peças grandes e menores desta Hinoki se unem por meio de junções talhadas para o encaixe. Não dá pra visualizar com esta explicação, eu sei, então, olha abaixo. Olha que lindo este prédio quebrando sua contemporaneidade arquitetônica com peças desiguais e rústicas de madeira, esta hinoki. 

Contemporaneidade arquitetônica - Japan House

Ali, na Japan House, estavam em cartaz algumas exposições. Eu vi todas, mas vou contar aqui de uma. A que mais me chamou atenção pela contemporaneidade, leveza estética, conceitual e material, por fim!

A arte contemporânea do Japão é aqui retratada por meio do trabalho de Kohei Nawa, um dos principais nomes da nova geração de artistas multidisciplinares do país. ‘Espuma’ é uma instalação mutante. Com aparência de nuvem, a ‘obra’ resulta de uma combinação química de soluções (detergente, glicerina, água). A mistura faz crescer essa nuvem em volume, de uma maneira descontrolada, como a divisão celular de um corpo em desequilíbrio, mas a sensação que tem o espectador é de suavidade, como se estivesse caminhando entre nuvens que se modificam a cada segundo.

Localizada no térreo da Japan House São Paulo, esta escultura transitória fica em um ambiente azul, com iluminação programada para revelar sua constante transformação. A obra de Kohei Nawa revela  uma sua obsessão estética: seu olhar sobre as estruturas moleculares, das quais toda a vida é feita. Transformar microbiologia e química em arte, com essa visão microscópica de como o mundo se organiza além do limite de nossa percepção,é o que move esse artista multidisciplinar.


O profundo interesse pela maneira como as coisas se organizam ou se desorganizam é a essência desse projeto. Espuma: pequenas bolhas ou células que, constantemente, se formam na superfície de um líquido similar a um sabão. O intrigante de sua obra está em dar forma e imagem às silenciosas moléculas invisíveis de que somos feitos. Abrir essa porta da percepção é como abrir um telescópio para dentro de nossa origem mais vital e fazer disto arte.

Caminhar pelo espaço é uma experiência similar a caminhar sobre nuvens, mas nuvens de matéria orgânica, como as estruturas de nosso interior porque químicas, moleculares. Essa ideia do encontro entre a paisagem imaginária e a paisagem interior é algo desconcertantemente inovador. Provoca.

Saí da Japan House pronta para sentar com a Louca da Casa para tecer esta longa prosa de que os faço testemunhas! Enchendo a cabeça com estas provocações em campos estéticos muito distantes, só uma Serra Malte pode me dar  boas conclusões e percepções para tudo tanto.