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domingo, 7 de fevereiro de 2021

CINEBIOGRAFIA DE GABO - INTERTEXTUALIDADE A TODO VAPOR


 

A memória permeou toda minha interação com a cinebiografia de Gabriel Garcia Marquez, meu Gabo desde há muito, com a intimidade definindo minha relação com o homem e sua obra. GABO – LA CREACIÓN de GABRIEL GARCIA MARQUES - todos os seus livros citados ou ali descritos revolveram lembranças e foi algo catártico, somehow, porque foram livros deveras significativos para mim, cada obra a seu tempo, no meu momento.

Apesar de ter começado meio do avesso, só que não, cada livro teve presença de fato nos meus dias. Comecei minha incursão por sua literatura com 100 ANOS DE SOLIDÃO, que me enveredou através da complexa genealogia dos Buendía, pelo realismo mágico e por muitas outras de suas obras. Do avesso, porque o tamanho e a dimensão da família guardam alguma complexidade para uma iniciante literária, junto a seu nascente estilo.

Me surpreendeu muito me lembrar de um trecho lido logo ao início, falando de um tempo em que ainda não havia palavras, sendo necessário apontar para designar.

Gostoso conhecer a origem da lendária MACONDO, que sempre teve um lugar especial em meu imaginário, guardando certa magia, origem do realismo fantástico em minha vida. Inspirado em Aracataca, vila diminuta nos Confins da Colômbia, onde passou sua infância, guarda as cores do estilo reverberado por ele.

Vida e obra do autor são descritas através de inúmeros depoimentos e trechos de uns 10 selecionados romances. Para compor GABO, personagem de si; outros personagens, agora de suas histórias, conversam ou narram intercaladamente, promovendo uma intertextualidade latina fantástica e saborosa. Para ele a literatura era algo que nunca podia estar apartado de suas relações e isto fica patente nos depoimentos.

Me causou particular (e surpreendente) boa impressão, os depoimentos de Clinton sobre o autor e sua obra. Depoimentos de largo portfólio de suas relações dão perfil largo ao protagonista porque visto de ângulos bem distintos.

O filme bem sucede em sua tentativa de entender a estranha história do menino nascido na pobreza em um vilarejo desconhecido dos confins da Colômbia e alçado a destaque inconteste da literatura mundial.

Entre suas idas e vindas da Colômbia, Europa, Nova York e México, em uma visita a  Aracataca, pela primeira vez, depois de deixar a cidade, teve a ciência da grandeza de sua história e valor de sua experiência. Nós também, GABO, através de sua literatura, os flashes de seus dias nos iluminam!

 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

ALGUÉM TEM QUE OUVIR O CORAÇÃO

 

Ele começa se (in)definindo entre argentino e brasileiro. Nem um, nem outro. Ou um e outro. Não o reconhecem como nativo lá, tampouco aqui. Ou o reconhecem lá e aqui também. Ele é BABENCO em ALGUÉM TEM QUE OUVIR O CORAÇÃO E DIZER: PAROU

É um doc metalinguisticamente autobiográfico, dá para entender a redundância? Deixa eu explicar. Pensa comigo: um doc falando de si, porque é sobre a vida de um cineasta. Então, o protagonista Hector Babenco, que é co-diretor (na prática) junto a sua esposa, Bárbara Paz, está sempre trazendo o cinema e o doc, em si mesmos, para o centro da trama.

Sei que tá muito confuso. Deixa eu tentar simplificar de novo. Doc sobre um cineasta é um doc sobre o cinema. Cinema sobre cinema, pela biografia de um cineasta, vida e obra.

E um dos sabores mais fortes desta produção é ver o quanto vida e obra aí se misturam. Onde  acaba uma e começa a outra? O cinema, a vontade de viver e o estar vivo são indissociáveis, segundo o próprio.

Ele diz sempre ter tido uma confiança ilimitada em sua capacidade de ter sorte e sobreviver e a gente tira a prova em função dos seguidos prazos-limite de vida que lhe são dados por médicos, em hospitais e até países diferentes. E ele segue por cerca de 30 – TRINTA – anos sobrevivendo.

Seus prazos não superavam nunca o ano corrente, então. Falavam de, no máximo, mais um ano. E ele passava e seguia vivo por vários seguintes.

A cumplicidade desenvolvida entre ele e Bárbara – dividindo o filme e dividindo a morte dele, é algo enorme. Ele dirige a própria morte. E a cena que ela faz de si mesma, sem ser spoiler, é catártica. Só.

Plasticamente, o filme é lindo, fotografia, P&B, seleção de imagens, tudo conspira junto aos significados que o filme exala explorando vida e obra do cara, por ele mesmo, consciente e poeticamente.

Lidando conscientemente com o avanço progressivo da doença e a perda de capacidades e funções, mexe com a gente no questionamento da extensão e da força do humano.

Ao passo que vídeo-registros de suas conversas com equipes de vários filmes de sua autoria, clássicos de nossa cinematografia, nos dão uma boa visão de seu papel na direção e de suas escolhas nos roteiros, na luz, nas falas, nos ângulos, nas cores, nas expressões, em TUDO.

Sei bem que estou hiperbólica, mas deixa ser, deixa estar, é o que sinto e aos meus olhos de agora o doc nos deixa a impressão de onipotência e onipresença de um diretor como ele. Representa uma espécie de Deus de um universo e tempo delimitados.

“Estou morrendo, mas meu coração não quer parar. Quer continuar.”

As cenas inicial e final, com imagens de Hong Kong, trilhadas por BREATHE – RADIOHEAD, me tocaram particularmente, apesar das críticas que li da desarticulação destas escolhas. Para mim, não, e o cinema, além da produção autoral e significados na origem, é cada um que o vê e todo seu hipertexto cognitivo. Ele faz menção a Hong Kong que, junto aos significados da música – Breathe, Exit Music for a Film -  diz tudo e mais, só no nome, para mim.

Ele morreu como viveu. Filmando, till the end – exit music for a film.

Em cartaz no YouTube e no Google Play

 

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