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terça-feira, 27 de novembro de 2012

many sides of the moon (11 11)



Referências que se multiplicam

Ele, visivelmente, se perdia falando, entre as músicas e se encontrava nelas.

Em pulsante show, Otto lança ‘The Moon 11 11’, álbum carregado de referências que vão do cinema de Truffaut, passam por extremos como Pink Floyd e Odair José, The Smiths e The Cure até chegar a Fela Kuti. O disco é, assim, o resultado de um estudo, uma construção, feitos em cima de filmes e álbuns musicais.

Uma viagem de Otto entre o binário, 11 11, da linguagem dos computadores, o filme Fahrenheit 451 de Truffaut e o espaço, entre outras referências, batizaram ‘The Moon 11 11’.
O lançamento foi 11 de Novembro, 11/11, como bem pede o nome do trabalho.


E o show foi solar. Catártico e dançante, trazia forte trio percussivo de Peixinhos (Olinda), duelando com as distorções da guitarra de Catatau. Para completar, um trio de cordas fez participação em algumas músicas.


Assim, a pluralidade musical deu o tom do show, aproximando ritmos distantes, com bases sintéticas/eletrônicas, ao lado de elementos tipicamente regionais. Dois extremos que produziam um resultado novo e vibrante.


Otto caminhava livremente entre as cadeiras do público do SESC lotado e grande parte deste, ficou de pé, dançando ao lado do palco. Uma loucura convidativa e saborosa, embalada por uma trilha sonora pulsante.


Dançando sensualmente no que nos parecia uma viagem sua, entre piadas, muitas e brincadeiras a cada intervalo, Otto, em determinado momento, diz: “O problema é que tudo é ao vivo”. E a naturalidade da língua que se falava ali, ao vivo, contagiava. Otto com seus músicos, com o público, com participações especiais, com a atriz Karine Carvalho.


Um show saborosamente cantado, tocado, dançado e contextualizado em suas referências, entre música e outra. E foram tantas, contextualizações, razões de ser e bobagens que ele, ao final, pontua: “Hoje ‘tá parecendo um stand up”

sábado, 24 de novembro de 2012

histórias para vestir


Um diálogo da moda com a cultura em ‘figurinos-espetáculo-passatempo’.

Croquis junto a cores e desenhos, junto a histórias,  junto a textos, junto a manequins, junto à música, à poesia e à literatura.  Costurados todos por sua leitura e suas contextualizações.

Ronaldo Fraga comemora 35 coleções convidando o público a visitar seu universo pelo ‘quarto de memórias’ de seu processo criativo.

É a mostra ‘Cadernos de Roupas, Memórias e Croquis’, em cartaz na Casa Fiat de Cultura, no Circuito Cultural da Praça da Liberdade, em Belo Horizonte.

E nesta mostra ele nos traz ‘sua’ escrita particular, como ele bem se traduziu. São nove ambientes com instalações que trazem material gráfico, croquis, vídeos e roupas. Ronaldo decidiu privilegiar seu trabalho como ilustrador. Um ‘seu’ registro gráfico de sua moda.

São histórias para vestir “transformando música, literatura, cultura brasileira e alguns buracos de ‘seu’ tempo em mapas-desenho e desenhos-memória” como ele mesmo nos conta.

Logo à entrada da exposição, um pomar exibe os frutos de sua criatividade. Modelos de diversas coleções, só nos moldes, brotam de árvores que se fazem cabide. E os caules destas árvores são um mix de suas referências culturais todas, desde sempre.

A montagem da exposição, por si, é uma atração. Seguindo os mesmos moldes de suas coleções, ela traz nestes suportes toda sorte de histórias de universos paralelos.

Fascina a quantidade de referências imersas em seu olhar e sua abordagem.

Por ilustrações alusivas à sua obra ou por palavras em textos, poesias ou músicas, por cores e formas ele traz Rosa e seu Sertão, Drummond e sua poesia, Pina Bausch e seus movimentos, Nara Leão e os contextos que fazem suas músicas, o Bispo e sua loucura feita arte, entre muitos outros.

São infinitas possibilidades feitos ‘pano’, estampa e cores, em uma leitura pessoal. Todos pedindo,qual esfinge, que os decifremos. 

O corpo é suporte para um intercâmbio cultural de modo que, ao vestir Ronaldo, você estampa significados.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

estranhos são os outros





Órfão e rejeitado por sua família adotiva, Sam é um ex-escoteiro da equipe do comandante Ward (Edward Norton). Suzy é apenas uma dentre os vários filhos pequenos de Walt (Bill Murray) e Laura Bishop (Frances McDormand), que,  por alguma razão, não consegue se enturmar com amigos ou mesmo com sua família destrambelhada.

Suzy e Sam sentem-se deslocados do mundo. Depois de se conhecerem em uma apresentação dominical da ‘Arca de Noé’ na igreja local, se apaixonam e resolvem deixar para trás a ilha em que vivem,  rumo a uma vida a dois no continente. Os adultos  ficam preocupados com as decisões da dupla e se esforçam para trazê-la de volta.

O microcosmo, universo regido por leis próprias, ferramenta  característica da filmografia de Wes Anderson, em Moonrise Kingdom, surge na forma de uma ilha na costa da Nova Inglaterra, New Penzance. Tanto Suzy quanto Sam são outsiders, crianças que não se encaixam na sintonia fabulosa que parece reger este universo criado por Anderson em seu mais novo trabalho.

Em meio à fuga, Suzy e Sam sentam-se em cima de uma rocha para ver a paisagem que os rodeia. Suzy, então, conta a Sam que não desgruda de seus binóculos em função dos poderes mágicos que ganha com eles. Através deles, ela consegue ver tudo de perto, se aproximando e se ‘inserindo’, de certa forma, em um mundo do qual sente que não faz parte.

No entanto, toda a esquisitice dos personagens parece estar em certa sintonia, o que nos faz perceber que os padrões de normalidade deles são aqueles e, portanto, outsiders somos nós. Nós, Suzy e Sam.  E por isso, os dois decidem fugir para a floresta juntos.

Através deles somos lembrados de como os  primeiros amores parecem, muitas vezes, o ingresso para um mundo fantástico.

Moonrise Kingdom resgata todo o  visual estilizado com que Anderson coloriu seus filmes anteriores. Identifica-se seus traços e suas cores característicos no cenário, no vestuário, nos  diálogos, nas direções e decisões, na trilha sonora.

Os personagens, todos, são, notadamente, filhos de seus maneirismos.  Maneirismos carregados de significados e leituras que denotam um (seu) universo milimetricamente orquestrado.

Para muitos, seu cinema chama mais atenção por detalhes estéticos e narrativos, que lhe dá identidade, mas seus filmes vão além disto.

Os personagens que se destacam são aqueles que, imperfeitamente humanos, não conseguem se adequar a uma sociedade. Ele, assim, joga luz sobre  socialmente desajustados. A trama é, como de hábito, um caso de desarranjo social e afetivo.

 Nos filmes de Anderson, o ambiente familiar é recorrente na abordagem destes temas. E é nos desvios que compõem estas diferenças, todas, que vislumbramos a beleza e a força da alteridade.

sábado, 10 de novembro de 2012

realidade paralela



Em seu novo filme,  Elefante Branco, o diretor argentino Pablo Trapero  provoca fortes questionamentos em grandes temas,  recheados de preocupações sociais.

Julián  é um padre que dirige a paróquia de Villa Virgen, favela erguida em torno da carcaça de um hospital, projetado para ser o maior da America Latina  e nunca construído. É o elefante branco do título, que tornou-se, junto a outros conjuntos de prédio do bairro, uma imensa ocupação habitacional. 300 famílias ali vivem  ilegalmente e as ruínas do Elefante Branco são uma fotografia da ausência do Estado, em realidade paralela.  

O ‘cenário’ aqui é, assim, a favela, espaço estereotipado pelo cinema brasileiro, na estética e na linguagem,  mas somando o olhar de Pablo Trapero, em ‘cores’ suas.  Através de um estilo que nos dá uma fotografia mais completa (e complexa) do universo retratado, provocando reflexões, Trapero não usa a linguagem do filme de ação para ‘espetacularizar’ a violência .

Ricardo Darín é Júlian,  e recebe Nicolás (o ator belga Jérémie Renier), que deve ser seu sucessor na coordenação daquele projeto social na ‘vila’. Os dois são padres católicos, atuantes na comunidade, que têm seu trabalho limitado pela guerra local do narcotráfico e nos conduzem, assim, em um questionamento da função da igreja em situações tão extremas.

Qual o papel social da igreja? E sua legitimidade enquanto instituição? Qual o alcance e os limites de uma sua atuação prática na comunidade? Qual o significado da dimensão ‘teatralizada’ e ritualística de suas cerimônias em um mundo de realidade tão forte, exasperadora e que fala tão alto, grita, clamando por ajuda?  

E o filme segue, assim, provocando um sem-número de interrogações. Questiona-se mesmo as razões de ser de limitações e proibições impostas aos seus, aos clérigos e aos fiéis. Diante do cenário que nos oferece o filme, uma (outra) pergunta aparece em nossas legendas pessoais: qual o valor de regras e hierarquia de um sistema diante da vitória do ‘não-sistema’?

Quando a câmera se detém no rosto dos protagonistas, encarando suas dúvidas e angústias, fica para nós, espectadores, um visível confronto de possíveis papéis da igreja. O ritualístico e o atuante.  Há cenários que, sim, estes papéis convivem, mas em outros são, claramente, irreconciliáveis e antagônicos. Porque a realidade, aí, fala muito alto.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

trilhando desafios


Tudo começou bem  enquanto éramos  somente  nós, os três andarilhos,  a trilha e seus obstáculos menores como gravetos, galhos, mato, uns desníveis aqui e ali, pedras y otras cositas mas. Beirávamos um trecho da mata nativa da Floresta da Tijuca e pretendíamos subir até o Redentor pela  sedutora trilha do Parque Lage, no bairro do Jardim Botânico, no Rio.

Enquanto o cenário desenhava poucos obstáculos, como parecia no início, eu estava bem e até pensando cá comigo: ‘Ahhhh! Que moleza! Esse troço de trilha ‘tá ficando desafio pouco para mim!!!’

Meu cajado high tech me bastava para me devolver uma segurança que aquele terreno irregular tentava me tirar.

Depois de um tempinho trekando horizontalmente, começamos, então, a subir, com os mesmos muitos gravetos, pedregulhos, desníveis, galhos e com alguns acompanhantes adicionais:

- altos degraus ali posicionados pela mão humana n’uma tentativa de tornar ângulo tão forte de inclinação, algo transponível (ou não!).

- Numerosas e volumosas raízes de árvores que, diante da verticalidade do morro, que ali se fazia seu solo, eram parcialmente desnudadas e tornavam-se obstáculos (outros também altos).

Aí ferrou! Com tantos obstáculos eu precisava, muitas vezes, além de meu cajado high tech, das duas mãos, dos braços e do corpo de meu amor para me segurar ou me impulsionar ou me puxar.

Ainda assim, caí algumas vezes. Os múltiplos desníveis me provocavam vertigens. Eu procurava, procurava e não achava galhos ou árvores ou pedras ao derredor para me apoiar e fixar pernas e braços e… ahhhhhhhhhhh!!! Acabava por fixar corpo inteiro no chão!

Hora e meia de subida depois, um morro absoluta e invariavelmente vertical se colocou diante de meus olhos. Sem galhos, pedras ou troncos que me servissem de apoio, sentei e chorei.

Um  ‘casi drama mexicano’ tomou lugar naquela aventura trekkeira. 

“-Não consigo subir. Não consigo dar um passo adiante com isto tudo que tenho diante de mim. Estou atrapalhando o programa de vocês. O que era para ser uma aventura ganhou ares de assistência ‘pessoal’ de mão única. A de vocês comigo. Vocês me ajudam e eu não ajudo ninguém.”

Ao que eles me consolaram, ajudaram e  impulsionaram naquele e n’outros morros com forte pinta de intransponíveis que surgiram e assim seguimos.

Com duas horas de subida (ÍNGREME), soou o alarme da prudência: hora de voltar.

E veio em boa hora, este alarme. Se na vida dos normais (no quesito equilíbrio); para baixo, todo santo ajuda; em nossa ‘triste vida severina’ de desequilibrados; para baixo, todo santo empurra.

Mas enfim, tive de descer grande parte de nosso caminho de volta sentada, me arrastando encosta da montanha abaixo, me apoiando com as quatro patinhas no chão.

E na descida é que pude ver o tamanho (e a altura) das vitórias de minha subida (plurais)

Para quem chegou a não andar pela ‘simples’ falta de equilíbrio, estou quase uma malabarista.

Estímulos constituem a base de meu interminável processo de recuperação. E este trekking somou o claro estímulo físico de  todo a processo e um inestimável estímulo psicológico, o da vitória!