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sábado, 9 de fevereiro de 2013

o que nos espreita


Não, ‘Amor’, o filme, não é um romance, como o nome sugere.  Não daqueles de trama adocicada, com trilha sonora envolvente e lágrimas rolando.História de amor profundo, sem sentimentalismos, no entanto; cujo tema, de fato, é a dignidade da velhice e o direito de escolha quando saúde e sanidade se esgotam.

‘Amor’ traz a história  de um casal de terceira idade interpretado pelos magistrais,  Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva. Veteranos na nouvelle vague francesa, eles vivem aqui, Anne e George que, na primeira parte do filme, dividem pequenos prazeres do cotidiano com graça, nas felicidades, nos obstáculos, na simplicidade do dia a dia. Eles bem desenham e nos envolvem nas sutilezas de um cotidiano partilhado há muitos anos, com doçura, carinho e respeito.

Mas Anne sofre um derrame e eles passam a encarar juntos severas adversidades. E em uma segunda parte da trama, várias sequelas e debilidades passam a dividir os dias com eles que, sozinhos, vivem uma gradual descida ao inferno, no detalhe. E eles enfrentam com dignidade a irreversível derrocada produzida pela doença e acentuada pelo envelhecimento.

Um tratamento delicado, fundado em sentimentos nobres. A confiança, a entrega , a maneira serena de encarar os fatos da terrível fatalidade que os acometeu, suas consequências e sequelas.  E é muito forte e intenso, no filme, o modo como eles vivem cada uma destas sequelas, cada deficiência, com absoluta consciência do degradar da velhice que os espreita.

Não é um filme fácil, mas comove pela inteligência e sensibilidade adultas ao retratar a vida de maneira crua e realista, mas delicada e densa.

Trintignant domina o filme simplesmente de modo magnífico, nobre, corajoso. A dureza dos cuidados cotidianos revela uma  cumplicidade incomum e o desenrolar das opções à frente deles é conduzido com grande respeito a tudo o que eles sempre foram.

Em Anne, a progressiva transformação dos gestos, expressões e movimentos, no decorrer da história, destaca uma atuação impecável. A maneira como sua elegância é despedaçada e vai cedendo espaço às falhas no  corpo, em meio a tanta dor e sofrimento, conduz, insistentemente, a uma pergunta:  vale a pena viver desta forma?

Os conceitos de certo e errado, moral e imoral vão sendo desconstruídos a cada sequencia. A miséria humana se mostra um peso insustentável diante do drama que eles vivem e da dimensão do 'irreversível' que os espreita.

O filme passa, de forma clara e forte, a mensagem de que é diante das adversidades e dificuldades que se 'prova' o amor de fato. A coragem  é forte  no filme, este ‘grito’ pela liberdade individual, pelo direito de escolha em momento tão extremo.

Trata-se de um filme que deixa o espectador triste e pensativo sobre o fim inevitável de uma vida, mas não manipula o pranto. Faz refletir. É tudo conduzido de forma lenta, gradual e crua.  Não há nenhuma glamorização.

Emocionalmente, é um nocaute. O filme se traduz em uma tentativa de conferir inteligibilidade a um gesto extremo e radical  e nos mostra, com crueza, algo que nos esforçamos por não nos lembrar: a inexorabilidade do fim.

2 comentários:

  1. Um bom filme, com dois ótimos atores, discutindo de forma crua, a decadência física causada pela velhice. Sem muito entusiasmo... nota 7 para Amour.
    Breno.

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  2. Poligirl, tua análise sobre o filme nos leva a refletir sobre a dignidade de vida e o direito de morte. Temática "espinhosa", que deveria ser mais discutida em nossa sociedade. Enfim, Amour trata muito bem sobre "o fim da vida e do amor sem fim".
    Breno.

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