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domingo, 31 de maio de 2015

trilha da memória


Uma voz que, serena e docemente, provocou fundo a memória afetiva.

Quando eu era criança, beirando a adolescência e querendo parecer crescidinha, metida a amadurecida para a idade, me botei a escutar discos ‘de adulto’. Ao invés de ouvir ‘A Arca de Noé’, Balão Mágico’, e ‘Saltimbancos’, da minha prateleira sonora, que normalmente trilhavam meus dias açucarados, passei a querer música de gente grande.

E para viver a adulta que eu achava que crescia em mim, colocava, envaidecida, os discos, LPs, de minha mãe na vitrola.

E uma lembrança forte é que entre muitos Chico Buarque, alguns Vinícius, Gal, Elis, havia um tal Francis Hime que eu não sabia quem era, nunca tinha ouvido falar. Mas achava chique e maduro ouvir uma música que ninguém de minha turma  sabia coisa alguma. Nem eu (em segredo).

E ele estava lá, junto dos Chico Buarque. Só agora, velha de ‘Guerra’ (eu sou é eu mesma) e de show aprendi que eram parceiros contumazes, na vida e na arte. Até na prateleira de minha mãe.

O show, em sua sofisticação instrumental, me trouxe um tempo de volta e apesar de já ter andado discorrendo sobre a riqueza deste show, particularmente, senti vontade de trazer aqui nuances da forte memória afetiva que despertou em mim.

Era ele no piano, um cello, um baixo, uma harpa, uma bateria e três sopros.  Em trechos solo ou em perfeita harmonia soavam como carinho aos ouvidos. Primoroso. Um caminho musical fundado na suavidade, às vezes, com algumas curvas inusitadas , mas perfeitamente integradas à melodia.

A participação de Olivia Hime trouxe emoção e belas contextualizações às histórias musicais da família. Ou histórias da família musical.

Este show, como o primeiro a que vi, era apresentação de seu novo álbum, o ‘Navega, Ilumina’, mas o repertório foi espichado e ele acrescentou canções de parceiros e companheiros de uma ‘idade de ouro’ da música brasileira. Vinícius, Tom, Chico, entre outros.

E navegando por estes mares, uma vez mais, nos iluminou a todos. 

domingo, 24 de maio de 2015

parceria afinada


Celebrando trinta anos de parcerias musicais, Ná Ozzeti e José Miguel Wisnick apresentaram(-se) ‘Ná e Zé’, álbum reunindo 14 canções compostas pelo músico, oito delas inéditas em discos.

O repertório, de certa forma, refaz a trajetória comum de ambos, que se cruzaram, musicalmente, pela primeira vez em 1985, encontro que foi o ponto de partida para uma trajetória artística, muitas vezes dividida.

Ná, que após conhecer Zé, se encantou com as novas referências e com o casamento perfeito entre melodias e letras e passou a incluir canções dele em seus shows e acabou gravando várias. A celebrada parceria deriva em delicadeza forjada na intensidade, carregando uma emoção difícil de explicar. Tem que ver, melhor, ouvir. Os dois juntos. 

Já comparados, no trabalho comum, com Elis e Tom, Ná e Zé se conectam nas vozes e nos sentidos que nos traz o professor de literatura mergulhado em poesia e em contextos poéticos.

Canções carregando significados muitos, da poesia e literatura, tradicionais e contemporâneas.  

Nestes momentos, as legendas musicais que Wisnik apresenta show afora são aulas líricas em prosa.

Em  defesa de uma poligamia artística, falando do prazer e do aprendizado de parcerias, Zé nos diz ali que “a arte é uma das possibilidades de felicidade humana”.  E o show nos faz sentir!    

domingo, 17 de maio de 2015

morador de mim


Quem é você que me habita?
Quem são estes olhos que, tão meus, se fazem olhar diferente.
Quem é você, tão parte do que sou, se alimentando e se construindo, peça por peça, de meu sangue.
Quem é você, tão pequeno em meu ventre, me provocando um mundo inteiro de mudanças, no corpo e no coração.

Permanece aí, crescendo e se construindo que eu, daqui, sigo te esperando, aprendendo de mim, de você, de você em mim, de nós dois sempre. E experimentando um amor maior que eu, maior que meus sonhos, maior que me sabia capaz.

Segue aí se tornando meu filho e eu sigo aqui te esperando. Esperando e querendo, sempre e mais, para um dia te entregar (deliver) ao mundo; entregando também a ti, este mundo de presente, embrulhado em laço poliana, transformando as pequenas alegrias e prazeres cotidianos na feita lendária felicidade. Porque felicidade é só questão de ser. Esta é minha melhor lição.

Quero te dar sonhos de presente e te ensinar a lutar por eles, todos os dias, nos pequenos gestos e nas grandes atitudes, querendo e buscando sempre.

Quero te mostrar em meus braços, em meu abraço, o sentido maior de sentimento, daquele que se sente na pele, nas vísceras, nos olhos.

Quem é você, meu filho, que mal chegou e já me derrama poesia, me fazendo tão bem.  Mal chegou e já te sinto pulsando em meu ventre, me enchendo de vida e de amor, te querendo muito e mais, todos os dias. Te sentindo a cada dia mais próximo, com mais força, mais certeza e mais serenidade.

Quem é você, meu filho?

domingo, 10 de maio de 2015

poesia encarnada



Mãe...
Na simples descoberta cabe uma poesia inteira.
No corpo, uma vida... a caminho...
É a hora que nos perguntamos
qual o tamanho de nossos sonhos?
o que, em nós, escapa a qualquer explicação, que não à magia, ao milagre?
por mais que a biologia, a medicina e qualquer ciência tenha todas as respostas...
Elas não alcançam a mãe se inquirindo
O que me habita?
uma pequena pessoa, um pedaço meu, um filho... é o mundo!
Nestas horas a mulher brinca de Deus, carregando uma vida consigo a toda parte...
e divide a poesia da criação com toda a beleza que carrega, nestes casos, o dia a dia, o cotidiano. 

Uma descoberta que nos faz maiores e mais fortes, todos os dias. 
A mágia de carregar nada menos que uma nova vida é inestimável.

Nos descobrindo, vamos sentindo um valor maior e acima de nós
E tudo passa a caminhar alinhado às necessidades
desta criatura aqui dentro instalada, com as rédeas nas mãos
E assim, nestas horas, ganhamos a habilidade de conjugar o nós acima de todo eu
O cuidado diário é um cultivo esmerado.
Os bons hábitos adquiridos são crescentes e desejosos... 
de todo o melhor que cabe em um coração.
Que ora pulsa em dois e nos faz mais fortes
que qualquer dia nos imaginamos capazes
A curiosidade é crescente e a vontade é soberana.
As lágrimas, paradoxalmente, alimentam uma força inestimável!
E com ela vamos nos construindo, mãe e filho, para sempre!

domingo, 3 de maio de 2015

prosa musical


A ideia é que os artistas preparem um set list pessoal, exclusivo para a apresentação. Um set list entremeando produções de sua carreira e repertório significativo para sua formação musical, com canções oriundas de fontes diversas, desde aquelas referências de infância.

O projeto ‘Sala de Estar’ do SESC Pompéia convida, assim diferentes músicos para execução de repertório significativo em sua formação e na consolidação de sua carreira, legendados por intervenções narrativas, nos contextualizando a todos como e porque tal música carrega significados em sua vida ou dentro de sua obra. Tudo feito em tom de bate papo, como em suas salas de estar.

 E esta noite era Guilherme Arantes que bem conduziu o tom intimista dado pelo projeto, inaugurando-o com maestria. Transformando o palco em sua sala, ele trazia seu piano, uma grande orquídea, um excelente repertório de formação, muitas contextualizações  feitas causos, ricos e bem humorados.

Assim entre causo e outro, Arantes nos introduziu dois de seus pilares de formação (e de gosto) musical. Rock progressivo, com músicos citados e apresentados (Yes, Vangelis, Pink Floyd, entre  outros) e ainda Milton Nascimento e toda esquina em seu entorno (Clube da Esquina). As legendas de suas interseções com aquelas canções e aqueles artistas eram todas apresentadas com humor, traduzindo opções de repertório. E na sequência, apresentava suas  canções que guardam alguma relação com aquelas referências.

Entre canção e outra, entre referências várias, Arantes afirma que sua música flui muito mais pela mão que pela voz e segue, entre tecla e outra, nos relatando sua trajetória, de sucesso comercial pop a músico independente.

Com humor incansável nos conta as fórmulas de construção dos hits de novelas, as exigências, as possibilidades e desvios -  a censura e os possíveis contornos. Informalmente, seguia tocando suas referências e aquelas que lhe vinham à mente e seguia comparando, os tempos de hoje à sua época.  

Entre fórmulas de hits, lembra que os seus colocavam Luan Santana  no chinelo (palavras minhas!) e estouravam, na boca de todos, de março a outubro.

E cantando, fechou: “Adeus também foi feito pra se dizer,                                                                 bye bye, so long, farewell”!!!

E de pé aplaudimos!