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domingo, 25 de maio de 2014

fossem somente crianças


Voltando alguns dias no tempo para comentar um espetáculo a que assiti e, apesar de ótimo, não coube ainda em minhas entrelinhas, quiçá nas linhas, aquelas oficiais, tão à beira da loucura que ando.

Quero falar e contar e exclamar de dias passados virados. Virada Cultural Paulista 2014, este é o mote geral, mas o específico é dentro da viradinha, aquela dedicada ao público infantil. O pedaço maior de minha Virada foi, assim, diminutivo.  ViradINHA. Era um espetáculo da (ótima) banda Bixiga 70, com a participação de cantores convidados, em representação e reinterpretação do clássico musical ‘Os Saltimbancos’, de Chico Buarque (pra resumir a história -  parêntese dentro do parêntese, é que a versão brasileira é que é dele).

Mas seguindo com os Saltimbancos, em releitura dramatizada, seguindo o roteiro da apresentação original, desta vez via apresentação do Bixita 70, figuravam (coadjuvando?) a gata Anelis Assumpção, o cachorro Maurício Pereira, o jumento Skowa e a galinha Alzira E, além da Dona Operilda, condutora do espetáculo, personagem da atriz Andrea Bassit.

Além da riqueza musical proporcionada pela turma Bixiga, aquela apresentação lúdica no visual, na representatividade, nas canções e seus significados; aquele musical tão bem encenado e tão parte de minha infância me proporcionou uma viagem no tempo, despertando a sra  memória afetiva. Lembranças tão vivas de um tempo distante e saboroso que me trouxe, repetidas vezes, lágrimas aos olhos.

Em cima, os bichos Saltimbancos cantando e dançando, embaixo, “nós gatos” eufóricos; pais filhos e outros saudosos, “ felinos, não reconhecerás”.

“… E, quem dera, os moradores
E o prefeito e os varredores
E os pintores e os vendedores

Fossem somente crianaças…”

domingo, 18 de maio de 2014

traduzindo uma identidade


“O queijo é uma cerimônia. Tem que estar no café da manhã, no almoço e na ‘janta’.” Esta dimensão ritualística, dada a um simples componente de nossa cultura é um dos muitos ingredientes desta receita rica e saborosa  que define a identidade mineira.

 Assim, simplesmente apresentando esta citação, nas primeiras paredes da primeira sala, uma exposição  do Centro de Arte Popular da Cemig, em Belo Horizonte, me conquistou.  Nos definindo pelo tratamento dado a este pedaço forte de nossa cozinha, de nossa receptividade, de nosso afeto, de nossa  cultura, enfim.  

Parte do acervo permanente do centro, esta citação, dando ao queijo um sentido de cerimônia,  junto a outras características e traços culturais,  rastreia as raízes da formação da identidade mineira. Entre panelas de pedra, fogão à lenha, teares, bordados, esculturas, cerâmica, carrancas, oratórios; entre Araxá, Serro e Canastra, vemos muitos instrumentos da mineiridade e a história bem acabada de hábitos feitos cultura, com ‘jeitim’!

Funcionando em prédio histórico, pertim’ da Praça da Liberdade, o espaço que, por si, vale a visita apresenta 800 peças, em acervo rico e interessante, produzidas em diversas regiões do estado, como Vale do Jequitinhonha, Araxá, Ouro Preto, Prados, entre muitas outras, todas muito bem contextualizadas e ligadas pelo que apresentam de comum:  são arte popular, resultado, muitas vezes, de processos concretos da vida social. São artistas que traduzem o universo em que vivem no barro, na madeira, no bordado.

Através da exposição de arte popular de todo canto de Minas, a mostra bem explica o ser mineiro, nas entrelinhas. São a cozinha, os festejos devocionais, o tear, privilegiando a riqueza e a criatividade de manifestações culturais populares, explicando quem somos, colocando legenda em nossas atitudes e nos traduzindo pela alma.

domingo, 11 de maio de 2014

ladeira acima, história e arte

Viajando no tempo e no espaço, me encontrei por estes dias, em Ouro Preto. Viajando no tempo, duplamente. No meu tempo porque havia, já, algo nas bordas dos quinze anos, que não pisava por aquelas terras.  No tempo cronológico porque aquele ‘nosso’ pedaço pulsa passado e história.  Viagem no espaço porque desfruto o privilégio de, sendo mineira, de raiz e coração, ser também turista por aquelas fronteiras.
E a atmosfera daquelas ladeiras, todas, nos transporta para além dos limites geográficos. Ali, barrocamente, se respira história e o Rococó em seu estado original traz a nós, mineiros, uma identidade incomum, em um rebuscamento de linhas e ângulos, pinturas  e ouro que conversa conosco , nos trazendo, no conjunto, uma harmonia.
Entre ladeira e outra (outras, muitas), subindo e subindo, visitamos muitas e ricas igrejas, Ricas em nossa história e em sua arquitetura e arte.
Ali, muito tempo depois de várias excursões de escola, para ver e entender o barroco e para conhecer in loco as nuances de nossa ‘Inconfidência Mineira’, além de outros pedaços de nossa história colonial... Então, ali, depois de todo o conceito formado dentro de mim, algo que se destacou e fez figura em meu olhar  foi o dimensionamento do humano versus divino, Deus (assim, maiúsculo) v ersus homem (este minúsculo).
Aquelas igrejas todas, de pé direito lá no céu, são de uma imponência que cala. Inspiram grandeza.
Outra nuance pintada forte em minhas retinas, e esta já destacada por pintores e desenhistas, vários, que tiveram esta cidade por modelo, foram os telhados.  Eloqüentes e coloridos em nosso imaginário, identitários de um nosso retrato mental de Ouro Preto, são os telhados, que parecem reger uma sinfonia barroca para quem olha a cidade do alto.
Merece nota uma observação na questão da, digamos, harmonia plástica da cidade.  É visível e notória a existência de limitações na sinalização publicitária cidade afora.  Sem paredes ou muralhas pintadas, outdoors ou faixas e bandeiras.  A identificação das casas comerciais ao longo das ruas se dá por pequenas placas, em um tamanho padrão no que parece, somente, uma sinalização identitária. Não comprometem, assim, a harmonia do que já é rebuscado por si e em si.
Olhando para além dos morros do centro histórico, em um exercício nada fácil de observação e tentativa de análise do todo, além dos telhados e das fronteiras históricas, vemos os reflexos de um crescimento desordenado de um centro que concentra, hoje, sítios  e atividades ligados ao turismo por todas as ruas, em muitas das edificações.
É fato que na época áurea (duplamente falando), a população ali era maior que a de hoje, dada a importância do centro minerador. Mas hoje, grande parte das edificações destina-se ao turismo; como museus, restaurantes, lojas de souvenirs, pontos históricos tombados, etc.
Assim, para comportar sua população e atividades da engrenagem diária de um centro urbano, a cidade teve que alargar suas fronteiras e o fez ladeiras acima, em ocupações desordenadas, saltando morros e saltando a vista, fora do centro histórico.  
Dentro de suas fronteiras históricas, vemos uma cidade moldada pelas mãos de um dito ‘Aleijadinho’.  Antônio Francisco Lisboa nos presenteou, através de sua alma inteira, com uma "cid-arte" histórica.
Nestas esquinas, fica claro para nós, lá de ‘dendiminas’ , quanto do barroco temos em nossa personalidade. Nos rascunham  o temperamento, os morros, as esquinas, o rococó, finalizando este desenho em reserva, gentileza, a ‘bem-querência’.

domingo, 4 de maio de 2014

uma coisa de cada vez



Hoje, cinco anos pós tudo, sinto-me alcançando alguma estabilidade no temperamento. Emocional e cognitiva até.

Pelo processo de reconhecimento do si mesmo, de identidade, já passei! Mas foi uma  identidade exponencial: eu era eu mesma, mas era muito. Era eu muito e muito eu.

Mas, agora, além de me redescobrir, saber quem sou, vivo quem sou, ao dia. Sem tanta pressa, tanta pilha, tanta urgência. Sem ‘tanta’, porque, sem nada, não seria eu.  ‘Tudo ao mesmo tempo agora’ já não é minha frase favorita, a que melhor me define. Perdeu seu posto para ‘uma coisa de cada vez’, por sua conexão imediata a meu ritmo de recuperação e resgates.  Uma coisa de cada vez, ao passo e ao dia. Mas sempre alguma coisa lá, me provocando e me movendo. Uma minha isca para novas buscas, novos interesses, se renovando e reiniciando, devagar e sempre.

Alguma coisa no trabalho, estudando alguma coisa, culturando ou cozinhando, sempre. Virginiana (e) extrema sempre fui, acelerada, fora da média. Mas, houve um tempo, pós acidente, que queria nada menos que tudo;  n’alguma forma de compensação, talvez.

E meus olhos, meu ângulo tinham foco lá atrás, repisando, repetidamente, pré-justificativas para um suposto curto alcance, uma performance, assim, deficitária.

Hoje, alcançando algum equilíbrio, limitei, inconscientemente, o tempo de meu discurso  a um futuro digamos, condicional.  Se buscar isto, posso isso; se estudar bastante, reaprendo aquilo outro; se fizer assim, posso assado, uma coisa de cada vez.

O acidente deixa, assim, o papel de protagonista em apêndices retóricos  de todas as minhas histórias e projetos, sabendo que volto a me justificar por mim mesma; meus destaques, facilidades e por minhas limitações.  Afinal, ‘eu sou é eu mesmo’.